Roberto Lira
As reiteradas manifestações de pensadores e filósofos sobre a importância do conhecimento do si mesmo para a compreensão dos problemas humanos e nossas inquietudes sobre o tema é que nos tem levado a persistir nessas reflexões.
Nesta reflexão, vamos tentar evitar cair na armadilha de ficarmos enredados nas costumeiras polemicas das doutrinas que tratam da constituição do ser humano. Se se trata de um corpo com alma e espírito ou se somos uma essência divina, um eu superior, um atmã ou coisa semelhante, toda essa celeuma são apenas palavras (símbolos) que os especialistas inventam para suas explicações e proselitismos e que geralmente nos leva a ilusões, sem de fato contribuir para uma superação em nosso viver. O eu real que somos e que estamos tentando conhecer é aquele da existência cotidiana que labuta para sobreviver, que é sensato e insensato, que se irrita e se alegra, que é egoísta e altruísta, que é filho e pai/mãe, que é amigo e inimigo, que é generoso e mesquinho, que é compassivo e desalmado, que deseja ser reconhecido ou passar despercebido, etc. e etc. Enfim, esse é o eu que pensamos ser possível conhecer.
Compreendemos que qualquer processo de obtenção do conhecimento – ato ou efeito de conhecer por meio da experiência – nos remete a uma rotina que geralmente se inicia ao dirigirmos nossa atenção para algo de interesse. Nossa faculdade de observar dá seguimento à rotina disponibilizando o fruto do seu trabalho – um percebimento – a faculdade de entender que por sua vez avalia e conclui sobre o fato observado/percebido. Essa rotina é finalizada/concretizada com o respectivo registro na memória do fato vivido e, ao longo da vida, esses registros vão formando o conteúdo da consciência individual. Nesse processo de conhecer é evidente a condição de relatividade, visto que as capacidades/faculdades envolvidas na rotina são pessoais. Consequentemente, o conhecimento depositado na consciência é relativo.
Frente ao processo acima descrito, acreditamos que a grande maioria dos seres humanos possui algum conhecimento relativo de si mesmo, apesar de nos parecer que em geral é um conhecimento superficial. Também, nos parece que esse conhecimento por ser superficial não tem conduzido a humanidade a uma superação psicológica ao longo da sua história. Haja vista que a conduta humana observada nos relacionamentos, desde sempre, predomina a insensatez, o egoísmo, o desamor, a ausência de compaixão, etc. A natural contraparte benfazeja dessa conduta, por sua vez, está sempre em inferioridade quando o esperado num processo de superação e que ela seja predominante.
Se a saída para o ser humano superar sua estagnação psicológica é o autoconhecimento e tendo em vista que o autoconhecimento superficial não tem atendido essa demanda, aprofundar esse conhecimento seria a solução? Se sim, como e onde encontrar o fio da meada para alcançar esse autoconhecimento aprofundado? Novamente, nos deparamos com mais perguntas do que respostas. Em boa hora nos socorre a sabedoria popular e a prática científica ao salientar que o importante é inquirir – nesse dizer, a pergunta vem com a inspiração e a resposta com o trabalho, com a pesquisa e com o interesse. Assim sendo, nos sentimos tranquilos em continuar compartilhando nossos questionamentos.
Esse pretendido autoconhecimento, agora aprofundado, inclui a necessidade de se conhecer além do conteúdo da consciência, conhecer o conteúdo do inconsciente ou não? Se sim, como observar as ações movidas pelo inconsciente? No caso, as ações movidas pelo inconsciente necessitam ser registradas? Ou seja, nesse processo é necessário que as ações movidas pelo inconsciente se tornem conscientes ou não? Se sim, parece que cairemos na mesma forma de conhecer que não tem nos transformado. Se não, a rotina da atenção-observação-percebimento se realiza com uma mente “inocente”, sem um “censor” que julgue, compare, estabeleça normas? Ou seja, essa nova rotina é passiva, momento a momento, sem interferência do passado, do já conhecido?
Cada vez que nos propomos a reflexionar sobre conhecimento do si mesmo, agora tentando aprofundá-lo, percebemos que estamos caminhando num labirinto que vai se ampliando e aumentando sua complexidade. O paradoxo de caminhar nesse labirinto é que, em vez de tornar-se um fator de desestímulo para as reflexões, sentimos o interesse aumentado pelo assunto. Fazer o quê?
VOLTAREMOS A REFLETIR.
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