sábado, 19 de março de 2011

Persistindo no autoconhecimento


Roberto Lira

As reiteradas manifestações de pensadores e filósofos sobre a importância do conhecimento do si mesmo para a compreensão dos problemas humanos e nossas inquietudes sobre o tema é que nos tem levado a persistir nessas reflexões.
Nesta reflexão, vamos tentar evitar cair na armadilha de ficarmos enredados nas costumeiras polemicas das doutrinas que tratam da constituição do ser humano. Se se trata de um corpo com alma e espírito ou se somos uma essência divina, um eu superior, um atmã ou coisa semelhante, toda essa celeuma são apenas palavras (símbolos) que os especialistas inventam para suas explicações e proselitismos e que geralmente nos leva a ilusões, sem de fato contribuir para uma superação em nosso viver.  O eu real que somos e que estamos tentando conhecer é aquele da existência cotidiana que labuta para sobreviver, que é sensato e insensato, que se irrita e se alegra, que é egoísta e altruísta, que é filho e pai/mãe, que é amigo e inimigo, que é generoso e mesquinho, que é compassivo e desalmado, que deseja ser reconhecido ou passar despercebido, etc. e etc. Enfim, esse é o eu que pensamos ser possível conhecer.  
Compreendemos que qualquer processo de obtenção do conhecimento – ato ou efeito de conhecer por meio da experiência – nos remete a uma rotina que geralmente se inicia ao dirigirmos nossa atenção para algo de interesse. Nossa faculdade de observar dá seguimento à rotina disponibilizando o fruto do seu trabalho – um percebimento – a faculdade de entender que por sua vez avalia e conclui sobre o fato observado/percebido. Essa rotina é finalizada/concretizada com o respectivo registro na memória do fato vivido e, ao longo da vida, esses registros vão formando o conteúdo da consciência individual. Nesse processo de conhecer é evidente a condição de relatividade, visto que as capacidades/faculdades envolvidas na rotina são pessoais. Consequentemente, o conhecimento depositado na consciência é relativo.
Frente ao processo acima descrito, acreditamos que a grande maioria dos seres humanos possui algum conhecimento relativo de si mesmo, apesar de nos parecer que em geral é um conhecimento superficial. Também, nos parece que esse conhecimento por ser superficial não tem conduzido a humanidade a uma superação psicológica ao longo da sua história. Haja vista que a conduta humana observada nos relacionamentos, desde sempre, predomina a insensatez, o egoísmo, o desamor, a ausência de compaixão, etc. A natural contraparte benfazeja dessa conduta, por sua vez, está sempre em inferioridade quando o esperado num processo de superação e que ela seja predominante.
Se a saída para o ser humano superar sua estagnação psicológica é o autoconhecimento e tendo em vista que o autoconhecimento superficial não tem atendido essa demanda, aprofundar esse conhecimento seria a solução? Se sim, como e onde encontrar o fio da meada para alcançar esse autoconhecimento aprofundado?  Novamente, nos deparamos com mais perguntas do que respostas. Em boa hora nos socorre a sabedoria popular e a prática científica ao salientar que o importante é inquirir – nesse dizer, a pergunta vem com a inspiração e a resposta com o trabalho, com a pesquisa e com o interesse. Assim sendo, nos sentimos tranquilos em continuar compartilhando nossos questionamentos.
Esse pretendido autoconhecimento, agora aprofundado, inclui a necessidade de se conhecer além do conteúdo da consciência, conhecer o conteúdo do inconsciente ou não? Se sim, como observar as ações movidas pelo inconsciente? No caso, as ações movidas pelo inconsciente necessitam ser registradas? Ou seja, nesse processo é necessário que as ações movidas pelo inconsciente se tornem conscientes ou não? Se sim, parece que cairemos na mesma forma de conhecer que não tem nos transformado. Se não, a rotina da atenção-observação-percebimento se realiza com uma mente “inocente”, sem um “censor” que julgue, compare, estabeleça normas? Ou seja, essa nova rotina é passiva, momento a momento, sem interferência do passado, do já conhecido?
Cada vez que nos propomos a reflexionar sobre conhecimento do si mesmo, agora tentando aprofundá-lo, percebemos que estamos caminhando num labirinto que vai se ampliando e aumentando sua complexidade. O paradoxo de caminhar nesse labirinto é que, em vez de tornar-se um fator de desestímulo para as reflexões, sentimos o interesse aumentado pelo assunto. Fazer o quê?
 VOLTAREMOS A REFLETIR.

quarta-feira, 9 de março de 2011

O autoconhecimento


Roberto Lira

Alguns dos textos postados no Ilha de Pala estão relacionadas, de certa forma, com nossa caminhada em busca do autoconhecimento. Conhecer a si mesmo é algo que tem sido recomendado, por pensadores e filósofos, desde épocas imemoriais – uma inscrição no oráculo de Delfos (atribuída aos Sete Sábios Gregos que viveram no VI e V a.C.) advertia: “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”. Os caminhos/métodos para essa descoberta são inumeráveis. Também podem ser diversos os conceitos do que seja o autoconhecimento e a sua finalidade.
Não é demais lembrar que, nesta escrevinhação não vai nenhuma pretensão de aclarar nem aprofundar tecnicamente o assunto. Vamos utilizar a oportunidade apenas para expor algumas reflexões e que estas possam nos instigar na busca desse autoconhecimento.
Certamente as inquietudes que levam os seres humanos a buscar algo são gestadas na insatisfação da sua condição particular. Essa busca, alimentada por expectativas de superação da condição que o ser se encontra, pode apresentar distintos propósitos.  Não vamos situar o autoconhecimento como objeto de investigação epistemológica ou com finalidade de busca de natureza ética ou espiritual. Vamos conduzir esta reflexão de forma simples e extensiva para não delimitar futuras manifestações que venham a ser instigadas.
Assim, que propósito(s) move o ser humano a buscar o autoconhecimento?
Observamos que alguns seres, norteados pela tradição grega, buscam o autoconhecimento como uma forma de conquistar saúde e liberdade; Outros, persuadidos pelo romantismo alemão de Goethe, buscam conhecer a si mesmo para libertar-se das cadeias que o prendem a este mundo físico; Nesse sentido, outros seres orientados pelas filosofias/religiões orientais buscam o autoconhecimento para alcançar o Nirvana (estado permanente e definitivo de beatitude, felicidade e conhecimento, meta suprema do homem religioso) ou moksha (libertação do ciclo de renascimento e da morte); Ainda outros, buscam conhecer a si mesmo para consolidar seu processo de evolução consciente na presente etapa de vida. Et cetera, et cetera, et cetera...
Como já advertido, não vamos nos acercar dessa questão por meio de teorias psicológicas ou qualquer linguagem técnica, particular de determinada ciência, filosofia ou religião. Outrossim, deixaremos em aberto a questão da finalidade, do propósito particular, do motivo para cada ser buscar esse conhecimento e nos concentraremos na questão do “como” realizar a tarefa de conhecer a si mesmo?
Frente a essa questão, surgem muito mais perguntas do que propriamente respostas. Assim, iniciamos questionando:
1.   o autoconhecimento pode/deve ser alcançado através de um método (sistema que regula uma determinada atividade)? No caso, necessitaríamos de um instrutor, um guru, um Mestre para nos garantirem essa realização?
2.   o autoconhecimento significa acumular conhecimento sobre o si mesmo ou significa um movimento sempre novo, momento a momento, portanto sem acumulação?
3.   o autoconhecimento é realizado acompanhado/seguido por/de um julgamento ou é realizado apenas com uma auto-observação passiva?
4.   o autoconhecimento é obtido com o observador sendo diferente da coisa observada (o eu) ou é obtido com o observador  reconhecendo ser a coisa observada?
5.   o autoconhecimento  se limita a perceber o conteúdo da consciência no chamado nível consciente (superficial) ou temos que penetrar no nível mais profundo, chamado nível inconsciente?
Essas e muitas outras questões podem ser reflexionadas para uma possível compreensão de “como” alcançar esse autoconhecimento. Podemos ainda não saber ao certo “como” conhecer esse eu, mas acreditamos que ele só pode ser conhecido momento a momento, no aqui e no agora e sem nenhuma imagem que tenhamos dele a ofuscar nossa observação.
Consentimos com aqueles que manifestam que compreender a si mesmo é de suma importância, visto que não podemos compreender os problemas humanos, os problemas do nosso viver, sem conhecer o sujeito que almeja compreender esses problemas. Sem conhecer o próprio eu.
Atenção para auto-observação (passiva?)!...
Atenção!  Aqui e agora!

quinta-feira, 3 de março de 2011

A verdade

 
Roberto Lira
Fomos instigado por um frequentador do Ilha de Pala a escrever o que pensamos sobre a “verdade”. Em sua manifestação ele nos disse:
 “Por mais que busque a verdade nas minhas leituras, sinto que o conceito de verdade é relativo, é algo muito delicado, a ser conduzido com todo cuidado, tem hora e lugar para ser colocada. O que pensa sobre ela, escreva no blog?”. 
O objetivo deste weblog é compartilhar idéias, reflexões e utopias. Entendemos que esse compartilhamento nos forma/reforma e/ou nos completa. Portanto, não podemos nos furtar ao desafio de compartilhar o que pensamos sobre a “verdade”, mesmo reconhecendo nossas limitações em ampliar o que o amigo palanês sintetizou em sua manifestação.
O vocábulo “verdade” enseja varias interpretações. Assim sendo, é impossível conceituá-lo/significá-la sem determinarmos o contexto em que ela estará inserida. Para isso, considerando como principais contextos para a “verdade”  o religioso, o científico e o das vivências humanas, optamos por escrevinhar o que pensamos sobre ela no contexto das vivências humanas.
Está reflexão nos levou a examinar a “verdade” a luz de duas premissas. Uma delas é a de que o observador é separado da coisa que observa. Essa premissa caracteriza a lógica adotada no Universo cartesiano e neste a “verdade” é considerada absoluta, ou seja, ela se apresenta como acabada e depende apenas de si mesma para existir. Ao se admitir a “verdade” como absoluta ela torna-se inquestionável e, desse modo, exclui todos os que não a admitem ou que a contestam. Na lógica dessa premissa a “verdade” situa-se no externo do ser humano e pode ser capturada por um indivíduo ou grupo de indivíduos. Esses indivíduos ao se apossarem de alguma “verdade” ou “pseudo-verdade” transfiguram-se em autoridades e com aquela(s) passam a criar ideologias e ismos.
Observamos que na cultura vigente ainda é predominante a “verdade” estabelecida com a premissa de que o observador se diferencia da coisa observada. Em nosso entendimento as “verdades” absolutas têm levado nossa civilização ao descalabro que há muito estamos vivendo: guerras, fanatismos, egolatria, desamor, entre tantas outras condutas nocivas. Por outro lado, é possível observar que este paradigma está em mutação. Para o surgimento de uma nova cultura pensamos ser necessário que a “verdade” seja admitida como relativa e observo que, a cada dia surgem mais indivíduos compreendendo que a “verdade” é relativa e não absoluta.
Entendemos que a “verdade” relativa tem sua base na premissa de que o observador é parte da coisa observada, ou seja, o observador e o observado são interativos e inseparáveis, o pensador não é separado do que pensa. É certo que aquilo que observamos além do nosso interno está lá (fora do nosso corpo), mas, também, passa a existir em nossa estrutura interna como fato percebido e incorporado, e não apenas como uma representação. Ao admitirmos a relatividade da “verdade” torna-se legítimo cada indivíduo ter sua “verdade” e isto possibilita ao ser humano o direito de construir sua própria visão de mundo. Do contrário, quando admitimos a “verdade” como absoluta a diversidade/complexidade humana, inerente a nossa condição, passa a ser considerada coisa fora de questão.
Na lógica da “verdade” relativa é subjacente que ela é construída nas interações entre o ser humano e o mundo que o cerca. Ela não é pré-existente. Desse modo, a “verdade” só pode ser percebida momento a momento. Daí, entendermos que para vivenciarmos a “verdade” verdadeira (para nos a relativa) precisamos nos manter no aqui e agora.
É ISSO, no momento, o que pensamos sobre a “verdade”.