Roberto
Lira
Neste
final de semana, a revista ISTOÉ publicou uma entrevista com o escritor Luiz
Fernando Veríssimo, onde as recentes manifestações espontâneas que se
espalharam pelo Brasil são o foco das questões. O escritor avalia as manifestações como
positivas, tendo em vista que os manifestantes “estão pedido tudo que a gente quer”. Quando perguntado quem é o
inimigo dos jovens de agora ele manifesta: “Pois
é, o inimigo é um sistema que não funciona, o que é muito vago. Se você quiser
ser específico, pode dizer que a rua está fazendo a critica ao capitalismo
brasileiro que o PT fazia quando era oposição, antes de se deixar cooptar. Mas isso é um diagnóstico ideológico e o movimento parece ser contra tudo. O inimigo
é tudo, inclusive a ideologia.” (Grifo
nosso).
Nos anos
oitenta, a juventude fazia coro ao cantor Cazuza em seu hit musical “Ideologia”. Ele iniciava essa música
com o lamento:
Meu
partido
É um
coração partido
E as
ilusões estão todas perdidas.
Na época,
eu não compartilhava desse lamento inicial do Cazuza, pois mantinha a esperança
que o recém fundado Partido dos Trabalhadores (PT) concretizasse meus sonhos juvenis
de ter um partido ético, ideologicamente voltado para o bem comum. Vinte anos
depois, minhas ilusões nos partidos (como dizia o Cazuza) foram todas perdidas com a cooptação dos petralhas do PT ao modus operandi dos políticos em todos os tempos. Cazuza antecipou em sua música a minha desilusão política, quando dizia:
Os meus
sonhos foram todos vendidos
Meus
inimigos estão no poder.
Demorei
a sentir e compartilhar a protestação do Cazuza. Os versos até aqui reproduzidos
representam o sentimento da juventude de hoje e também os meus. Embora o verso que finaliza o hit em pauta ao clamar:
Ideologia, Eu quero uma pra viver, não
represente o sentimento dos jovens de hoje, nem mais os meus. Por isso, passados
quase trinta anos, eu reconsidero o clamor de outrora e hoje (imitando o
Raulzito) quero dizer agora o oposto do que eu disse antes. Assim, grito em
alto e bom tom:
Ideologia...
NÃO quero uma pra viver.
O que
me fez mudar no que diz respeito à busca por uma ideologia? Não foi o sentimento de “inimigo de tudo”, que hoje se encontra nos jovens que se manifestam
nas ruas, como frisou Luiz Fernando Veríssimo na entrevista acima referida. O
que me fez reconsiderar sobre a questão de uma ideologia para se viver, foi à
compreensão de que as ideologias sacrificam o homem do presente para salvar (?)
o homem do futuro. Os idealistas nunca estão no presente. Para estes a vida é
sempre no passado ou no futuro, nunca no agora. Assim, o presente representa
apenas uma passagem para o futuro e por isso não é importante. Para os
idealistas o caminhar não importa, o que importa é somente a meta final a ser
alcançada. Desse modo o homem perde o presente, perde a sua vida. Só há um
verdadeiro viver. Só há um modo correto de viver, é viver no aqui e agora, o resto é:
Ideologia...
NÃO quero uma pra viver.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito bom texto, Roberto. Afiaste a pena antes de vê-la cinzelar o papel.
ResponderExcluirComo somos suscetíveis ao que observamos, por fim acabamos sendo influenciados pelo meio, acabamos por sucumbir aos apelos da vida, como não nos deixar provocar e evitar de ir além da observação? Somos humanos. A vontade que vigoriza a vida transcende a contenção do observador e nos emerge para gana de viver, principalmente ao sabermos que se vive apenas o presente, o futuro talvez chegará e o passado já se foi, então só nos resta o instante do agora, momento fugaz onde nossas vontades se afloram, manifestadas na atitude de querer ser mais que um mero espectador da história.
A contemplação e a passividade embora divirjam em seus significados, andam de mãos dadas, perigosas associações que espiritualidade insinua, e então o conflito, como e quando alcançar o meio termo, a equilíbrio entre a razão e a emoção, a onipresente e intangível verdade, mera ideologia, pode ser, mas como o bom senso, cada um o tem em sua medida exata, aludindo a Descartes. Com muito desprendimento, de tudo, é possível que alguns se consigam livrar-se delas, mas a que preço? Nessa jornada errante é provável que carregue meus fantasmas, companheiros de viagem que assombrarão meus dias de sol e me farão companhia nos dias sombrios. Continuo observando, caminhando e palpitando.
Grande abraço.
ps. idem ao texto anterior, mas sem erros, espero.