quarta-feira, 31 de julho de 2013

Deus segundo Spinoza


Certamente, Deus fala a cada um de seus filhos de acordo com o condicionamento deste. Meu condicionamento me induz a sentir as palavras de Deus como Spinoza o sentia. Por conseguinte fiquem com o filósofo holandês Baruch Spinoza: 

“Pára de ficar rezando e batendo o peito!

 O que eu quero que faças é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida. Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti. 

 Pára de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. 

Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias.  

Aí é onde Eu vivo e aí expresso meu amor por ti. 

 Pára de me culpar da tua vida miserável: Eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que tua sexualidade fosse algo mau. 

O sexo é um presente que Eu te dei e com o qual podes expressar teu amor, teu êxtase, tua alegria. Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer. 

Pára de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo. Se não podes me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de teus amigos, nos olhos de teu filhinho... Não me encontrarás em nenhum livro! 

Confia em mim e deixa de me pedir. Tu vais me dizer como fazer meu trabalho?

Pára de ter tanto medo de mim. Eu não te julgo, nem te critico, nem me irrito, nem te incomodo, nem te castigo. 

Eu sou puro amor. 

Pára de me pedir perdão. Não há nada a perdoar. 

Se Eu te fiz... Eu te enchi de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. 

Como posso te culpar se respondes a algo que eu pus em ti? Como posso te castigar por seres como és, se Eu sou quem te fez? 

Crês que eu poderia criar um lugar para queimar a todos meus filhos que não se comportem bem, pelo resto da eternidade? Que tipo de Deus pode fazer isso? 

Esquece qualquer tipo de mandamento, qualquer tipo de lei; essas são artimanhas para te manipular, para te controlar, que só geram culpa em ti. 

Respeita teu próximo e não faças o que não queiras para ti. 

A única coisa que te peço é que prestes atenção a tua vida, que teu estado de alerta seja teu guia. 

Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso. Esta vida é o único que há aqui e agora, e o único que precisas. 

Eu te fiz absolutamente livre.  Não há prêmios nem castigos.  Não há pecados nem virtudes.  Ninguém leva um placar.  Ninguém leva um registro. 

Tu és absolutamente livre para fazer da tua vida um céu ou um inferno. 

Não te poderia dizer se há algo depois desta vida, mas posso te dar um conselho. Vive como se não o houvesse. 

Como se esta fosse tua única oportunidade de aproveitar, de amar, de existir. Assim, se não há nada, terás aproveitado da oportunidade que te dei. 

 E se houver, tem certeza que Eu não vou te perguntar se foste comportado ou não. 

Eu vou te perguntar se tu gostaste, se te divertiste... Do que mais gostaste? O que aprendeste? 

Pára de crer em mim - crer é supor, adivinhar, imaginar. 

Eu não quero que acredites em mim. Quero que me sintas em ti. 

Quero que me sintas em ti quando beijas tua amada, quando agasalhas tua filhinha, quando acaricias teu cachorro, quando tomas banho no mar. 

Pára de louvar-me! Que tipo de Deus ególatra tu acreditas que Eu seja? 

Me aborrece que me louvem. Me cansa que agradeçam. Tu te sentes grato? Demonstra-o cuidando de ti, de tua saúde, de tuas relações, do mundo. 

Te sentes olhado, surpreendido?... Expressa tua alegria! Esse é o jeito de me louvar. 

Pára de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que te ensinaram sobre mim. 

A única certeza é que tu estás aqui, que estás vivo, e que este mundo está cheio de maravilhas. 

Para que precisas de mais milagres? Para que tantas explicações? 

 Não me procures fora! Não me acharás. Procura-me dentro... aí é que estou, batendo em ti.”

Baruch Spinoza

Marcelo Gleiser, em sua coluna na Folha de São Paulo, manifestou que Einstein e Newton enxergavam Deus na Natureza e que estes pensavam a ciência como uma ponte entre a mente humana e a mente divina e, ainda, que adorar a Natureza, compreendê-la cientificamente, era uma atitude religiosa.
rjtl

segunda-feira, 29 de julho de 2013

O que você quer?

Jiddu Krishnamurti (*)
Segurança, felicidade, prazer
O que é que a maioria esta procurando? O que é que cada um de nós quer? Neste mundo inquieto, onde todos estão tentando encontrar algum tipo de paz, algum tipo de felicidade, um refúgio, é importante descobrir o que é que estamos tentando buscar, o que estamos tentando descobrir. Provavelmente, a maioria está buscando felicidade, paz. Penso que é isso o que a maioria quer. Então, começamos a buscar, passamos de um líder para outro, de uma organização religiosa para outra, de um mestre para outro.
Mas estamos procurando felicidade ou estamos em busca de satisfação de algum tipo, da qual esperamos extrair felicidade? Há uma diferença entre satisfação e felicidade. Você pode procurar felicidade? Talvez possa encontrar satisfação, mas de modo algum pode encontrar felicidade. Felicidade é derivativa, é um subproduto de alguma coisa. Então, antes de entregar a mente e o coração a algo que demande uma dose de dedicação, atenção, pensamento e cuidado, devemos descobrir o que é que estamos procurando, se é felicidade ou satisfação. Receio que muitos de nós estamos procurando satisfação. Queremos ficar satisfeitos, queremos encontrar uma sensação de plenitude ao fim de nossa busca.
Quem está buscando paz, pode encontrá-la muito facilmente. Podemos nos devotar cegamente a uma causa, uma idéia, e esse será nosso refúgio. No entanto, isso não resolve o problema. O mero isolamento no refúgio de uma idéia não nos liberta do conflito. Então, devemos descobrir o que é que queremos, interna e externamente. Se descobrimos isso, não precisamos ir a lugar algum, nem procurar um mestre, uma Igreja, uma organização. Dessa forma, nossa dificuldade reside em sabermos com clareza qual é nossa intenção, não é? Podemos saber com clareza? Isso vem através da busca, da tentativa de descobrir o que os outros dizem, desde o mais elevado mestre até o pregador comum da igreja ali na esquina? É preciso recorrer a alguém para descobrir? No entanto, é isso que estamos fazendo, não é verdade? Lemos inúmeros livros, participamos de muitas reuniões, discutimos, filiamo-nos a várias organizações, tentando achar um remédio para o conflito, para a infelicidade em nossas vidas. Ou, se não fazemos isso tudo, achamos que nossa busca chegou ao fim, isto é, dizemos que uma certa organização, ou determinado mestre, ou um livro específico nos satisfaz, que encontramos tudo o que queríamos; e assim permanecemos, cristalizados e encerrados.
Nós procuramos, no meio de toda essa confusão, algo permanente, duradouro, algo que possamos chamar de real, Deus, verdade, o que você queira, pois o nome não importa, a palavra, seguramente, não é a coisa que define. Então, não vamos nos enredar em palavras, deixemos isso para os oradores profissionais. A maioria busca por algo permanente. Algo a que possamos nos agarrar, algo que nos dê uma certeza, uma esperança, um entusiasmo duradouro, uma convicção que dure, porque, no íntimo, somos indecisos. Não conhecemos a nós  mesmos. Sabemos muito sobre fatos, sabemos o que os livros dizem, mas não sabemos por nós mesmos, não temos uma experiência direta.
E o que é que chamamos de permanente? O que é que estamos procurando, que nos dará ou que esperamos que nos dê permanência? Não estamos procurando felicidade, satisfação e certeza duradouras? Queremos algo que dure para sempre e que nos dê satisfação. Se nos despojarmos de todas as palavras e frases e realmente olharmos para esse algo, veremos o que queremos. Queremos prazer permanente...
A felicidade não pode ser perseguida
O que você quer dizer com “felicidade”? Alguns dirão que felicidade é ter o que se quer. Você quer um carro, consegue um, então é feliz. Eu quero roupas, quero ir à Europa, e se posso ir, fico feliz. Quero ser o maior político que já existiu e, se consigo, fico feliz, se não consigo, torno-me infeliz. Então, o que chamamos de felicidade é ter o que se quer, é realizar, alcançar sucesso, tornara-se nobre, conseguir qualquer coisa que se queira. Quando quer alguma coisa e pode tê-la, você se sente perfeitamente feliz, não sente nenhuma frustração.  Mas, se não pode ter o que quer, sua infelicidade começa. Todos nós nos preocupamos com isso, não só os ricos ou os pobres. Os ricos e os pobres, todos querem algo para si, para sua família, para a sociedade e, se são impedidos, tornam-se infelizes. Não estamos dizendo que os pobres não devem ter o que querem. O problema não é esse. Estamos tentando descobrir o que é felicidade e se ela é alguma coisa da qual estamos conscientes. Será felicidade aquele momento em que tomamos consciência de que somos felizes, que possuímos muito? Esse momento não é felicidade, é? Então, não podemos ir atrás da felicidade. No momento em que temos consciência de que somos humildes, não somos humildes. Portanto, felicidade não é algo que se persiga. Ela vem para nós. Mas, se a procurarmos, ela fugirá.
O segredo da felicidade é o autoconhecimento no relacionamento
Você já está se compreendendo através do espelho de seus próprios pensamentos, no espelho do relacionamento. Acredito que a felicidade está em nossas mãos, e que o segredo dela é o autoconhecimento – não o autoconhecimento de Freud, Jung ou Shankara, nem de outros, mas aquele que vem com as descobertas que fazemos em nosso relacionamento, dia após dia. É através da observação, da percepção, sem o esforço do pensamento dia após dia, quando estamos em um ônibus, ou viajando de carro, quando falamos com a esposa, com os filhos, com os vizinhos, é através da observação de tudo isso, como se  olhássemos num espelho, que começamos a descobrir como falamos, como pensamos e reagimos, e vemos que, nessa compreensão de nós mesmos, temos algo que não é encontrado em livros, filosofias, nos ensinamentos de nenhum guru.

(*)  Trechos do livro: O que você está fazendo com a sua vida? – Jiddu Krishnamurti. Rio de Janeiro: Nova Era, 2010

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Ideologia

Roberto Lira

Neste final de semana, a revista ISTOÉ publicou uma entrevista com o escritor Luiz Fernando Veríssimo, onde as recentes manifestações espontâneas que se espalharam pelo Brasil são o foco das questões. O escritor avalia as manifestações como positivas, tendo em vista que os manifestantes “estão pedido tudo que a gente quer”. Quando perguntado quem é o inimigo dos jovens de agora ele manifesta: “Pois é, o inimigo é um sistema que não funciona, o que é muito vago. Se você quiser ser específico, pode dizer que a rua está fazendo a critica ao capitalismo brasileiro que o PT fazia quando era oposição, antes de se deixar cooptar. Mas isso é um diagnóstico ideológico e o movimento parece ser contra tudo. O inimigo é tudo, inclusive a ideologia.” (Grifo nosso).

Nos anos oitenta, a juventude fazia coro ao cantor Cazuza em seu hit musical “Ideologia”. Ele iniciava essa música com o lamento:
Meu partido
É um coração partido
E as ilusões estão todas perdidas.

Na época, eu não compartilhava desse lamento inicial do Cazuza, pois mantinha a esperança que o recém fundado Partido dos Trabalhadores (PT) concretizasse meus sonhos juvenis de ter um partido ético, ideologicamente voltado para o bem comum. Vinte anos depois, minhas ilusões nos partidos (como dizia o Cazuza) foram todas perdidas com a cooptação dos petralhas do PT ao modus operandi dos políticos em todos os tempos. Cazuza antecipou em sua música a minha desilusão política, quando dizia:
Os meus sonhos foram todos vendidos
Meus inimigos estão no poder.

Demorei a sentir e compartilhar a protestação do Cazuza. Os versos até aqui reproduzidos representam o sentimento da juventude de hoje e também os meus. Embora o  verso que finaliza o hit em pauta ao clamar: Ideologia, Eu quero uma pra viver, não represente o sentimento dos jovens de hoje, nem mais os meus. Por isso, passados quase trinta anos, eu reconsidero o clamor de outrora e hoje (imitando o Raulzito) quero dizer agora o oposto do que eu disse antes. Assim, grito em alto e bom tom:

Ideologia... NÃO quero uma pra viver.

O que me fez mudar no que diz respeito à busca por uma ideologia?  Não foi o sentimento de “inimigo de tudo”, que hoje se encontra nos jovens que se manifestam nas ruas, como frisou Luiz Fernando Veríssimo na entrevista acima referida. O que me fez reconsiderar sobre a questão de uma ideologia para se viver, foi à compreensão de que as ideologias sacrificam o homem do presente para salvar (?) o homem do futuro. Os idealistas nunca estão no presente. Para estes a vida é sempre no passado ou no futuro, nunca no agora. Assim, o presente representa apenas uma passagem para o futuro e por isso não é importante. Para os idealistas o caminhar não importa, o que importa é somente a meta final a ser alcançada. Desse modo o homem perde o presente, perde a sua vida. Só há um verdadeiro viver. Só há um modo correto de viver, é viver no aqui e agora, o resto é:

Ideologia... NÃO quero uma pra viver.